Acertos e erros na gestão de crises de reputação em uma sociedade global

Passamos da transparência à hipertransparência em uma sociedade global onde tudo, atualmente, é facilmente comprovável. Controlar a narrativa de uma empresa e protegê-la perante a opinião pública e todos os seus stakeholders é cada vez mais difícil e deve ser feita em tempo real, que é o que define o ritmo em um mundo digitalizado.

Curiosamente, essa realidade obriga todas as organizações a serem mais proativas em sua comunicação, convertendo a gestão da transparência no seu grande desafio. Uma realidade que adquire ainda mais importância em razão da corresponsabilidade que surge com a percepção de confiança, elemento-chave da gestão da reputação. Por isso, a transparência é, nos dias de hoje, um ativo estratégico do gerenciamento empresarial. Além disso, empresas transparentes em seu dia a dia serão premiadas durante o gerenciamento de uma crise reputacional pela opinião pública e seus grupos de interesse, já que estas partirão de um nível mais alto de confiabilidade e de um melhor contexto de relacionamento.

A conclusão é que ser transparente e responder agindo com rapidez e eficiência é fundamental na gestão de crise, além de ser um ativo imprescindível para proteger tanto a dimensão da marca quanto do negócio: é o ás do baralho de todas as organizações em momentos de crise.

Características do cenário de risco no contexto atual

Hoje, as empresas estão expostas 24 horas por dia, 7 dias por semana e 365 dias por ano à opinião pública e qualquer crise se propaga na velocidade da luz. Empresas, marcas, CEOs e gestores têm que estar preparados para responder demandas a qualquer momento, de forma rápida e ágil, uma vez que a escalada de uma crise não se dá em uma questão de horas, mas de minutos – a chamada “Golden Hour” já não existe –, e com uma projeção de impacto que não conhece fronteiras. Este contexto sociodigital nos levou a um cenário de hiperconectividade e hipervulnerabilidade. Um mundo em conectividade permanente, que permite a fluidez e o feedback de maneira imediata. A hiperconectividade se desdobra no ciberespaço, visto que vivemos em ambientes e circunstâncias totalmente dinâmicos, onde muitas crises manifestam-se primeiro nas redes sociais, o que também nos torna muito mais vulneráveis.

Por um lado, o cidadão está empoderado por sua facilidade de difundir e dar viralidade a qualquer tipo de conteúdo, em uma vida na qual as linhas onde começam e terminam o “on-line e o on-live” são difusas. Como explica José Antonio Llorente, sócio-fundador e presidente da LLORENTE & CUENCA em seu ensaio publicado na revista UNO 31, “Hiperconectados e Hipervulneráveis“, estamos testemunhando o nascimento de uma cidadania ciborgue em razão do uso de smartphones, o que converteu todas as pessoas em vetores de risco: Os cidadãos (muitos deles transformados em ciborgues, em virtude de suas extensões móveis) não apenas propagam a informação em questão de segundos, em escala planetária, mas às vezes o fazem com ainda mais interesse quando esta é falsa, como demonstraram, recentemente, pesquisadores do MIT“. Fator que não apenas favorece o crescimento do ativismo social, no qual usuários de serviços/produtos e pessoas se unem em torno de redes sociais e fóruns para reivindicar seus interesses, mas também alimenta as bolhas de desinformação.

Por outro lado, essa exigência de transparência provém de diferentes grupos de interesse: do cidadão, do usuário ou cliente, do consumidor, do parceiro, das associações, dos meios de comunicação, das instituições… Não há diferença: todos os stakeholders reivindicam, em maior ou menor grau, a transparência por parte de empresas, organizações ou governos, no exercício de suas atividades diárias. Um quadro que, no que diz respeito ao relacionamento com os meios de comunicação, exige que sejamos mais proativos, abertos e honestos. E a tudo isso devemos somar as ameaças cibernéticas, que nos apresentam um futuro incerto em razão da falta de proteção de dados, e o cibercrime, que inclui todo tipo de delitos digitais. Estes dois aspectos estão crescendo, tanto em termos de sua prevalência quanto de seu potencial disruptivo, conforme exposto no mais recente Relatório Global de Risco 2018 do Fórum Econômico Mundial.

Cabe destacar que entre os 5 maiores riscos globais por probabilidade citados este ano, o terceiro lugar do ranking é ocupado pelos ataques cibernéticos e o quarto, pelas fraudes ou furtos de dados, que incidem diretamente nos níveis de transparência das empresas. O crescimento vertiginoso da desinformação, das falsas notícias, das forças da rumorologia obrigam empresas a estarem permanentemente monitorando notícias e terem a capacidade de reagir para atuar e se comunicar diante de mentiras e riscos informativos ou meias verdades. “Acessamos um grande volume de informações sem poder digerir os dados, quando milhares de novas notícias substituem aquelas que as redes apenas acabaram de divulgar. É a mesma hiperconexão que tornou a sociedade hipervulnerável à desinformação, fraudes, boatos e todo tipo de ataques cibernéticos”, assinala Iván Pino, sócio e diretor sênior da Área Digital, e Luis Serrano, Líder Global da Área de Crise e Riscos da LLORENTE & CUENCA, no artigo “O novo paradigma da comunicação de crise e riscos“, publicado na edição 31 da revista UNO.

Em resumo, as empresas devem enxergar a transparência como um elemento estratégico e não como um inimigo de quem devem se esquivar, embora incorporá-la no dia a dia das organizações signifique repensar ou transformar a cultura corporativa e as formas de funcionamento. A transparência é um valor inalienável na construção e proteção da reputação e será a espinha dorsal da gestão de uma crise.

Autores

Eva Pedrol
Natalia Sara

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